Casa Civil Intervém em Resolução do Conanda: Direitos em Disputa
Intervenção da Casa Civil contra resolução do Conanda gera impasse jurídico e alerta para o direito à informação de vítimas em situação de vulnerabilidade.
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A atuação da Casa Civil do governo federal contra uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) provocou intensa repercussão política e jurídica. A medida, que estabelecia diretrizes de atendimento a menores em situações delicadas, incluindo orientações sobre interrupção de gestação prevista em lei, acabou sendo alvo de veto dos ministérios, por orientação direta do governo.
A decisão escancarou o embate entre diferentes setores da administração federal e levantou questionamentos sobre autonomia, direito à informação e a atuação de conselhos sociais diante de temas sensíveis.
O Que Previa a Resolução?
A resolução, aprovada em 23 de dezembro, foi construída para garantir protocolos claros e acessíveis no atendimento de crianças e adolescentes em contextos de risco. O texto teve 15 votos favoráveis da sociedade civil e 13 votos contrários de representantes do governo, sinalizando divisão interna no Executivo.
Entre os pontos principais estavam:
- Prioridade no atendimento em casos permitidos por lei
- Acesso garantido a informações imparciais, sem interferência de crenças ou opiniões pessoais
- Vedação a condutas baseadas em convicções individuais que dificultem o atendimento
O objetivo era fortalecer o acesso à saúde e à informação, especialmente para jovens em situações de extrema fragilidade.
A Intervenção da Casa Civil
Três dias antes da aprovação, em 20 de dezembro, a Casa Civil organizou uma reunião com representantes dos ministérios para orientar um voto contrário à resolução. Segundo participantes, o representante da pasta no Conanda, Amarildo Baesso, teria afirmado que “não haveria espaço para divergência” dentro do governo.
A fala causou desconforto entre conselheiros e foi interpretada como uma tentativa de centralizar decisões, mesmo em temas tradicionalmente debatidos em conselhos autônomos como o Conanda.
Pedido de Vista e Tentativa de Adiamento
Logo após a aprovação do texto, Baesso apresentou um pedido de vista, uma manobra comum para tentar adiar decisões e postergar publicações oficiais.
A estratégia coincidiu com o recesso de fim de ano e a troca de presidência do Conanda, o que poderia mudar o rumo da discussão e comprometer a continuidade do debate.
Bloqueio Judicial e Suspensão Inicial
No dia seguinte à votação, a Justiça Federal suspendeu temporariamente a resolução a pedido da senadora Damares Alves (Republicanos-DF), que utilizou o pedido de vista da Casa Civil como argumento para questionar a validade da votação.
Esse movimento foi visto como parte de uma tentativa de desmobilizar os efeitos do texto antes mesmo de sua publicação oficial.
Pressão Social e Reações de Organizações
Diversas organizações da sociedade civil, coletivos de juristas e entidades de defesa de direitos humanos se posicionaram contra a interferência governamental, classificando a ação como uma ameaça à autonomia do Conanda e ao direito à informação de jovens em situação vulnerável.
Para muitos, a votação foi uma tentativa legítima de garantir que crianças e adolescentes tenham acesso a informações claras, apoio técnico e decisões baseadas em evidências científicas — não em posicionamentos ideológicos.
Notas Oficiais e Impasse Jurídico
O Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania (MDHC) divulgou nota oficial afirmando que a consultoria jurídica da pasta considerou que os pontos abordados na resolução deveriam ser tratados por lei, e não por meio de atos administrativos.
Essa divergência jurídica contribuiu para o impasse e reforçou a judicialização da discussão.
Decisão Final: Resolução Publicada
Após recursos e discussões jurídicas, no dia 6 de janeiro, o desembargador Ney Bello, do TRF-1, acatou o pedido para garantir a publicação da resolução. O texto foi finalmente oficializado no Diário Oficial da União em 8 de janeiro.
Essa publicação representa uma vitória para grupos defensores de direitos civis, que acompanharam o caso desde o início.
Reflexões Finais: Um Conflito Além da Política
O episódio expõe um cenário em que decisões técnicas e de interesse social colidem com estratégias políticas e divergências internas no governo.
Enquanto o Conanda tenta garantir direitos básicos, acesso à informação e atendimento humanizado, a Casa Civil impõe vetos e orientações que, na prática, dificultam o avanço de políticas públicas voltadas a públicos vulneráveis.
Esse impasse revela o desafio de equilibrar interesses institucionais com os princípios constitucionais de proteção integral a crianças e adolescentes.
O Que Está em Jogo?
- A autonomia de órgãos colegiados como o Conanda
- O direito à informação em contextos de saúde e proteção
- A articulação entre sociedade civil e governo na formulação de políticas públicas
- A transparência nas decisões do Executivo sobre pautas sensíveis
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