Aplicações estragadas para espionar um ex-assessor do então candidato Donald Trump. Pesquisa falha por um ex-espião britânico encarregado de uma missão delicada e política. E um FBI lutando contra o relógio da temporada eleitoral para desvendar suspeitas sobre o conluio do governo estrangeiro que temia que pudesse ter graves implicações para a segurança nacional.
Um relatório de 306 páginas do conselheiro especial do Departamento de Justiça, John Durham, está redirecionando a atenção negativa para uma das investigações politicamente mais significativas da história do FBI: a investigação sobre se a campanha presidencial de Trump em 2016 conspirou com a Rússia para influenciar o resultado da eleição.
As descobertas não são lisonjeiras para o FBI, com Durham afirmando que ele se precipitou na investigação sem uma base adequada e rotineiramente ignorou ou racionalizou as evidências que minam sua premissa. O relatório cataloga uma série de erros – embora muitos já tenham sido documentados anos atrás por um relatório separado do inspetor geral do Departamento de Justiça, e o FBI diz que tomou várias dezenas de medidas corretivas por conta própria.
Uma olhada em algumas das principais descobertas do relatório de Durham.
UMA INVESTIGAÇÃO ‘SERIAMENTE DEFEITO’
O relatório dedica um espaço considerável à decisão do FBI de abrir, em 31 de julho de 2016, uma investigação sobre um possível conluio criminoso entre a campanha de Trump e a Rússia.
A investigação foi iniciada depois que soube por um diplomata australiano que um associado da campanha de Trump chamado George Papadopoulos alegou saber que a Rússia tinha “sujeira” sobre Hillary Clinton na forma de e-mails. A essa altura, era bem sabido que agentes russos haviam hackeado e-mails democratas, e Trump até pareceu convidar publicamente Moscou a procurar as comunicações de Clinton.
Mas, de acordo com Durham, o FBI correu para a investigação sem ter nenhuma evidência de que alguém da campanha de Trump tivesse tido contato com qualquer oficial de inteligência russo. Ele identifica pelo nome os especialistas em Rússia no FBI e em outras agências que nunca foram consultados antes do início da investigação e diz que, se tivessem sido, teriam dito que não havia informações apontando para uma conspiração entre a Rússia e a campanha.
O relatório afirma que o FBI caiu sujeito ao “viés de confirmação”, ignorando, minimizando ou racionalizando repetidamente as evidências que minam a premissa de conluio, incluindo uma conversa na qual Papadopoulos negou veementemente saber sobre qualquer relacionamento cooperativo entre a Rússia e a campanha de Trump.
Ele também diz que os investigadores não corroboraram uma “única alegação substantiva” em um dossiê de pesquisa financiada pelos democratas que foi compilado por um ex-espião britânico, Christopher Steele, e ainda continuou a citá-la em pedidos ao Tribunal de Vigilância de Inteligência Estrangeira para espionar um ex-assessor de campanha de Trump, Carter Page.
MAS SERÁ QUE DESCOBRIU ‘O CRIME DO SÉCULO’ COMO TRUMP PREVIU?
Não, não. Apesar de identificar erros abundantes, o relatório e a investigação mais ampla não corresponderam ao hype de Trump. O ex-presidente afirmou que isso revelaria o “crime do século” e exporia uma “profunda conspiração do estado” de altos funcionários do governo para inviabilizar sua candidatura e, posteriormente, sua presidência.
Mas o relatório rendeu apenas uma condenação – uma declaração de culpa de um funcionário pouco conhecido do FBI – e os dois únicos outros casos apresentados terminaram em absolvições no julgamento. E embora Durham tenha acusado o FBI de viés de confirmação, ele não alegou que o viés político ou o partidarismo eram fatores orientadores para as ações do FBI.
‘RIGO, OBJETIVIDADE E PROFISSIONALISMO’
O FBI respondeu às críticas de suas ações observando que a conduta ocorreu sob diferentes lideranças do FBI, meses antes do atual diretor Christopher Wray assumir o cargo principal. Ele também disse que já tomou dezenas de medidas corretivas destinadas a evitar que os mesmos problemas se repitam.
Isso inclui etapas destinadas a garantir a precisão dos pedidos que o FBI arquiva em um tribunal de vigilância secreta quando deseja espionar as comunicações de suspeitos de espionagem e terrorismo. Por exemplo, disse o FBI, os agentes agora devem fornecer mais informações, incluindo a identificação e divulgação de evidências que possam minar sua premissa de que a vigilância é garantida. Além disso, o FBI trabalhou para melhorar a supervisão de fontes humanas confidenciais.
O FBI disse em uma carta a Durham que estava confiante de que, se essas medidas tivessem sido implementadas em 2016, as “falhas detalhadas em seu relatório nunca teriam acontecido”. Em uma declaração separada, disse que o relatório reforça a importância de garantir que o FBI continue a fazer seu trabalho com o rigor, a objetividade e o profissionalismo que o povo americano merece e espera com razão.”
A CAMPANHA DE CLINTON FOI TRATADA DE FORMA DIFERENTE?
Sim, Durham argumenta. Ele observa que o FBI em 2016 também investigou alegações no livro “Clinton Cash”, de autoria de um escritor conservador que alegou que governos estrangeiros estavam canalizando dinheiro para a Fundação Clinton em troca de acesso. Tanto Hillary Clinton, a candidata presidencial democrata, quanto o ex-presidente Bill Clinton há muito negam qualquer irregularidade.
O FBI rotulou suas análises ligadas a “Clinton Cash” como “investigações preliminares”, disse Durham. Mas a investigação de Trump sobre a Rússia, disse ele, “foi imediatamente aberta como uma investigação completa, apesar do fato de ter sido igualmente baseada em informações não verificadas”.
Ele argumenta que o FBI mostrou cautela sobre a possibilidade de influenciar a campanha de Hillary Clinton, o que não demonstrou na campanha de Trump.
Para enfatizar seu ponto, ele cita algumas das mensagens de texto entre os ex-funcionários do FBI Peter Strzok e Lisa Page, cuja antipatia expressa em particular por Trump há muito é citada como evidência de parcialidade.
“Mais uma coisa: (Clinton) pode ser nosso próximo presidente”, diz-se que Page escreveu a Strzok. “A última coisa que você precisa (é) entrar lá carregado para o urso. Você acha que ela vai se lembrar ou se importar que foi mais doj do que fbi?
UMA SUBIDA NO CONGRESSO FICA MAIS ÍNGREME
O relatório Durham é outro golpe para o FBI, que está tentando persuadir o Congresso de que é um administrador responsável da inteligência.
Os legisladores estão começando a debater se devem renovar um programa de vigilância dos EUA que captura grandes quantidades de e-mails e telefonemas de estrangeiros. O programa autorizado pela Seção 702 da Lei de Vigilância de Inteligência Estrangeira expira no final deste ano.
O relatório de Durham chama a atenção para erros que os republicanos já citaram como razões para revisar a Seção 702. O FBI não usou a Seção 702 para vigiar Page. Mas suas omissões perante o tribunal de vigilância primária há muito irritam os republicanos, que sinalizaram que não renovarão a Seção 702 sem mudanças visando o FBI.
“É essencial que o Congresso codifique proteções claras que evitem futuros abusos do FBI e restaure a confiança do público em nossas instituições de aplicação da lei”, disse o deputado Mike Turner, republicano de Ohio que preside o Comitê de Inteligência da Câmara, em um comunicado.
Um número significativo de democratas, por sua vez, quer separadamente limites para quando o FBI pode pesquisar dados de vigilância estrangeiros coletados sob a Seção 702.